27 de fevereiro de 2021

 SÁBADO, 27 DE FEVEREIRO DE 2021 - 360º dia da pandemia

OU SEGUNDO DIA DO PENÚLTIMO MÊS A CONTAR DO FIM
Que maneira de dizer o dia não é!? Talvez. Claro que podemos dizê-lo de muitas outras formas, tantas quanto a nossa imaginação o permita.
O calendário do tempo, dividido em anos, meses, dias, horas, minutos, segundos, nos seus múltiplos e instantâneos momentos, esse monstro criado pelo homem na sua pandémica mania de tudo medir, de tudo querer controlar. Tudo. Com o tempo deu-se mal!.
É certo que vamos cumprindo inexoravelmente o calendário, inventado a olhar as voltas que a Terra dá sobre si própria e em simultâneo com o longo passeio em volta da estrela baptizada com nome masculino e por isso, travestida de um deus que durante milhares de anos, para muitos povos que já cometiam o erro pecaminoso de quere medir os tempos do tempo, justamente, através dele, do Sol ou da sua sombra. Mas isto são divagações minhas.
Cheguei à idade em que o tempo se gasta vez mais depressa,
Um inadequado e alarmante excesso de velocidade, pelo menos para mim que tenho esta, paradoxal e estupida sensação de gastação, sentir que o tempo se gasta tanto mais depressa quanto menor é o espaço de tempo que ainda tenho para gastar.
Quando completei, em Novembro passado, 72 voltas, em redor do Sol e girei como tudo à minha volta, mais de 30 mil vezes, já há um tempo que notei que os dias passavam mais depressa que a passagem do ano que passou num ano que tinha passado no tempo do fósforo, e depois carnaval, Páscoa, as férias da neta, as férias de todos, o Verão, o cair da folha, de novo o Natal, adeus a mais um ano, e assim, eis que já foi mais um carnaval, vamos embalados na Quaresma já com a Páscoa à vista, a pensar no Verão da imunidade grupal ou lá o que é.
Uma corrida. E olho para trás e mesmo em tempo de pandemia, com o tempo fechado a maior parte do tempo, penso: já se gastou um ano?
A minha mãe, que morreu com 96 anos, uma excelente conversadora gostava de estar sempre acompanhada e falar sobre tudo, a propósito de tudo, nos últimos anos que falava muito sobre o passado - vamos falando sempre mais sobre o que está para trás de nós à medida que ele se avoluma lá atrás - e eu tinha a sensação de que perdera a noção dos tempos por falar sobre coisas muito distantes no tempo, umas das outras, mas como se tivessem acontecido num plano, sem tempo no calendário. Acho que era uma defesa dela contra o tempo.
Um dia destes vou experimentar navegar nessa realidade irreal, para ver se funciona melhor! Tudo no mesmo plano e que se lixe o tempo!

6 de fevereiro de 2021


Aqui há tempos li, já não sei onde, que amadurecemos com o passar dos (D)anos; achei graça com aquele "dê" agasalhado nos parêntesis e estrategicamente colocado antes da palavra "anos".
Na vida vamos, de facto, aprendendo mais com os danos que com os anos e é isso que nos dá a resiliência necessária para continuarmos e para não nos repetirmos nos mesmos erros.
Amadurecer sem envelhecer, uma arte caprichosa que poucos sabem levar até ao fim; amadurecer mas sempre vivos como se o futuro não tivesse aquele momento de previsível imprevisibilidade onde tudo acaba.
Sonho por realizar; arrependimento que não tem tempo para ser; um segredo que vai connosco; um amor que se guarda egoísta e único; uma paixão que ficou para sempre no nosso coração como se tivesse memória, o nosso coração...

Na vida, todos temos
um sonho inalcançável
um remorso irreversível
um momento imprevisível
um segredo inconfessável
um amor indivisível
uma paixão inesquecível. 

5 de fevereiro de 2021

SOZINHO EM CASA

 

- Já moraste sozinho?
- Não. Porquê?
- Então não sabes o que é solidão!
- Dizes isso porquê? Quantas vezes estamos cercados de gente e...
- Pois, está bem, já sabia que ias dizer! Mas isto assim é horrível!
- Logo falamos... agora tenho de mandar uns mails... até logo.
- Ciao... - desligo a chamada do Vítor -
Tenho as estantes cheias de livros; sou capaz de saber todos os que não li e que comprei por comprar, num impulso. Ficaram deitados, às vezes meses, numa pilha na prateleira debaixo da mesa da sala antes de irem intrometer-se numa das filas da estante, atrás de molduras e de bibelôs; poderiam ser excelentes companhias mas agora não me tem apetecido ler.
Tenho três gavetas da escrevaninha cheias de CDs de tudo o que toca, orquestras ligeiras, o Paul Mauriat com os sons dos Beatles, dos ABBA, dos Bee Gees, filarmónicas e sinfónicas, a opus 41 do Mozart a 5ª do Beethoven, o Hino da Alegria com a Sinfónica de Viena e o Von karajan e o Bernstein, as valsas do Strauss e os nocturnos de Chopin; e a música popular brasileira, e os grandes poetas letristas e os albuns dos grandes anos 60, 70 e 80 e os meus "animais de estimação" e as suas baladas de Scorpions, White Snake, Guns N' Roses, Aerosmith... e tantos outros só que não me tem apetecido ouvir música.
Tenho ligado a televisão mas desespero à procura de algum canal que não esteja "contaminado" pelo vírus da actualidade e também não seja com aqueles filmes que já passaram centenas de vezes, por isso passo horas em "zappings" frustrantes até que carrego no botão do comando para desligar aquilo e recostar-me exausto no sofá.
Venho aqui ao PC teclar coisas sem nexo que elimino, entrar no mail para ver se há novidades de alguém que eu não conheça ou abrir o facebook ler meia dúzia de posts dos amigos e de outros que nem conheço, num esforço de comentar, para logo deitar abaixo, porque não me apetece escrever. Fujo, sei lá porquê, de responder no messenger aos amigos que me interpelam, que me mandam uma foto de uma anedota qualquer ou um vídeo que nem chego a abrir.
Olho, pela janela, a rua deserta com os mesmos carros alinhados no passeio há um mês, o alfa preto do meu vizinho do segundo B à procura de lugar para estacionar, parece ser o único aqui do prédio que volta do trabalho de controlador aéreo no aeroporto e, à porta a dona Arminda e o marido do sétimo D que chegam do Pingo Doce com os dois sacos carregados de compras. O resto é uma rua cinzenta como o tempo que faz, como os prédios de fronte, como o jardim antes da curva, como as lojas fechadas, o café do sr. Luís e a lavandaria do gajo indiano, mal encarado mesmo quando não há confinamento.
Em meses de confinamento, sem poder sair à rua, sem encontrar gente, sem falar com alguém cara a cara, sem ser pelos "whatsapps", quem se sentirá acompanhado ou por outra, quem será capaz de não se sentir só? Vou deitar-me. Demoro algum tempo a olhar a cama a medir o tamanho da minha vontade. Será que é sono o que sinto? Ou será que é apenas cansaço da vida? Apago a luz e cerro as pálpebras no esforço de chamar o sono e ponho-me a pensar nos tempos que me parecem distantes, tão irrecuperáveis, de antes da pandemia.... oxalá sonhe esta noite com gente alegre e a liberdade primaveril dos girassóis!
Solidão é não gostar de estar consigo próprio.
É menosprezar a vantagem de estarmos livres para fazermos o que bem entendermos sem que tenhamos de nos preocupar com os outros; mas, nós não somos ilhas embora possamos viver em ilhas.
Saramago disse que "para conhecermos a ilha é preciso sairmos da ilha" pois poderá ser verdade. Gosto do Saramago, acredito!
Será que se sair de mim, saberei melhor o que sou? Quem sou?
E, será que isso me ajudará a estar só (comigo)?
(... e foi a minha homenagem a quem vive só este confinamento... )