17 de outubro de 2014

CAFÉ CENTRAL

Chamava-se Café Central e ficava no centro do largo.
E o largo era o centro de tudo.

No Verão, quando a vila se animava mais
com toda aquela gente, que vinha de fora,
à procura do cenário ideal para descansar o corpo
e temperar a alma, dos distúrbios de um ano de cidade,
uma fila de cadeiras e mesas em verga amarela e azul,
esticava-se pelo passeio, encostada à parede do edifício do clube, 
para ter uma sombra e ganhar a brisa do fim de tarde.

Eu comprava o jornal no quiosque junto ao coreto

e sentava-me na última mesa, quase à porta do clube,
a passar os olhos por notícias que mal lia, por fotos que mal via.
Vinhas naquele vestido de algodão, leve como pluma,
cor azul, céu de primavera e corolas esverdeadas
a querer voar-te do corpo a cada passo que davas.
Acenavas-me, ainda de longe, do outro lado do largo,
e eu já a sentir os teus lábios no sorriso dos olhos,
e o cheiro a alfazema que saltava da tua pele
onde o Sol deixava sempre uma camada dourada.

Depois íamos, por ali fora, junto à muralha do castelo,

ao fim da tarde, mãos dadas, a ouvir o bater de asas e o piar
das gaivotas que pairavam círculos, em contra-luz,
sobre barcos pousados no espelho da baía.
Umas vezes falávamos de tanta coisa, 
outras, de nós também. 
Sem planos para aquele quase paradoxo
de nos querermos, sem nos termos.
Ou de nos termos mais um ano, todos os anos,
naquele mês de estranho encantamento.

Ate que, um Verão, esperei todo o tempo do mundo,

que era o que tu me dizias que nós (ainda) tínhamos,
quando avançava futuros onde cabíamos os dois.
Não houve mais vestido cor de primavera
nem cheiro a alfazema a sair da pele, nem sorriso nos olhos.
No ano anterior, nas asas de uma gaivota,
tinha dito que te amava e ficaria contigo para sempre.
Não sei se foi por medo da eternidade mas tinhas razão. 

Nada é eterno.

Nem o Café Central. 
Nesse ano cedeu lugar a um banco...