4 de outubro de 2014

INSÓNIA


Permaneço quieto, exausto, na obscuridade do quarto, 
naquela lucidez inútil de não conseguir imaginar nada,
nem sequer um pedaço de sonho. 

Pisco os olhos, cerro as pálpebras, abro os olhos;

agora vou abrir muito os olhos para ver se consigo contar as tábuas do tecto do sótão
ou ponho os olhos para trás da cabeça, num esforço que me faz doer o pescoço
num esforço que faz doer a almofada.
Estou a tentar contar as barras de ferro da cabeceira da cama.
Inútil! Já nem contar sei.

Volto-me para a esquerda. Costumo adormecer melhor, de lado, para a esquerda.

Volto-me para a direita. Nunca adormeci virado para direita.
Aí estou, de novo, de costas no colchão, com os olhos muito abertos, colados ao tecto.
Doí-me o corpo; doí-me a alma...
Que alma? Eu não tenho alma. Só corpo!
Ah! E olhos! Também tenho olhos. Olhos abertos colados no tecto.
É verdade; e a boca seca...

Levanto-me. 

O quarto parece-me maior e o buraco escuro onde devia estar a porta, mais longe.
Não sei onde estão os chinelos, nem o roupão
e vou de pés nus, de corpo nu, de alma nua (eu já não tenho alma) não sei para onde.
Também não importa nada. 
O que eu não quero é este quarto, nem esta cama, 
nem esta lucidez inútil de não conseguir imaginar nada
nem sequer um pedaço de sonho.