23 de janeiro de 2023

DIÁLOGOS E MONÓLOGOS

 

Há dias que se gastam sem grande escolha para se fazer o que quer que seja ou para que se tornem melhores. Quando acordei, pela manhã de hoje, assaltou-me um 'não sei quê' que me disse que hoje poderia ser um dos tais dias. E foi!
Um dia que se gastou...
Por isso, agora que estamos já muito perto do seguinte, é curioso recordar o que me teria passado pela cabeça para abrir este dia com aquele diálogo entre um médico e um menino que escrevia poemas e que se queixava "dói-me a vida, doutor" e o remédio para a atenuar era fazer o que melhor sabia: SONHAR!
Talvez tenha sido, hoje, isso que me faltou.
Capacidade para dar ao meu dia um pouco de 'sonho'.
Vou experimentar amanhã!
- Dói-te alguma coisa?
- Dói-me a vida, doutor!
O doutor suspendeu a escrita. A resposta, sem dúvida, surpreendera-o Já Dona Serafina aproveitava o momento:
- Está a ver, doutor? Está ver?
O médico voltou a erguer os olhos a enfrentar o miúdo:
- E o que fazes quando te assaltam as dores?
- O que melhor sei fazer, excelência.
- E o que é?
- Sonhar...
Este diálogo é um curto excerto de um conto maravilhoso de Mia Couto,
"O menino que escrevia versos".
Nele se conta a história de D. Serafina, a mãe que levou o menino ao médico porque queria que o doutor o curasse de uma maleita: ninguém entendia o que ele dizia.
E o menino então escreveu:
De que vale ter voz se quando não falo é que me entendem?
De que vale acordar se o que vivo é menos do que o que sonhei?

SORRISOS


Acordei pelas 08H20 da "matina" com Sol a encher a claraboia do quarto e, abrindo a aplicação Meteored no smartphone com a temperatura a anunciar 4 graus Celsyus mas sensação de 2 graus, tive um primeiro arrepio. Brrrrrrrrrrrrrr...

Mas, o Sol deu-me algum alento!
Saltar cautelosamente - imaginem o que é saltar cautelosamente - da cama e afivelar um sorriso meio esbranquiçado, com o pijama arrepiado, em frente ao espelho da casa de banho, com a água a brotar pela torneira sem conseguir aquecer. Por fim, aí está!
Aproveitar para esfregar olhos, nariz e boca, alisar o redemoinho de cabelo que agora me mortifica a calvície - imaginem, careca e com um redemoinho - e finalmente SORRIR, SORRIR, SORRIR - apenas sorrir sem gargalhar porque o smartphone alertou-me através da agenda que hoje é "DIA DO SORRISO" mas não de gargalhada...
UM SORRISO
Entre ti e um sorriso, escolho-te a ti
Porque sem ti não conseguiria sorrir.
E, sorri!
Porque sorrir desarma os mal humorados
e contamina.
Mas tem de ser um sorriso de alma.
Só nos lábios, não chega.
Nos lábios,
um beijo perfeito é um sorriso da alma.
Por isso, o beijo de verdade
só é beijo se tiver alma e for sorriso.
E, sorrindo no brilho dos teus olhos
quando te beijo,
a minha alma sorri e os teus olhos beijam.

MOMENTOS

 

A sua vida tinha sido uma história de procura.
Viveu, durante muito tempo,
a vida do mundo e dos prazeres mas sem lhes pertencer.
Os anos de juventude tinham ido demasiado depressa,
imersos na prosperidade que só aos sentidos satisfazia
mas não ao coração.
E, quando se deitava pensava no amanhecer,
acordar na manhã seguinte,
já a manhã se esvaía no andar do relógio.
Ver-se ao espelho, sem maquilhagem, lábios sem cor,
olhos inchados por mais uma noite desassossegada,
pele numa palidez translúcida de cadáver.
E a lágrima que escorregava pela face sem poder defini-la.
Se pela saudade do tempo que tinha sido,
se pelo desgosto do tempo sem tempo de ser.