23 de novembro de 2021

TRAIÇÕES DA MEMÓRIA

 

Cada vez te demoras mais.
Já nem sei se vens..
E eu sem conseguir adormecer.
Chego a pensar que te perdes na escuridão do jardim, no silêncio da casa, no frio do quarto, no vazio da cama.
Talvez seja melhor procurar a tua presença a preto e branco, na moldura ao pé do candeeiro em cima da cómoda, daquela vez que fomos os dois à praia e eu insisti para subires a escada de madeira e eu cá em baixo, joelho na areia, num equilíbrio forçado a focar o vestido de alcinhas e ramagens, a focar o teu corpo na contra luz.
Talvez seja melhor procurar a tua presença naquela canção francesa que tu costumavas cantarolar baixinho no meu ouvido como se fosse um segredo e que terminava comigo a sentir os teus lábios quentes a apertarem o lóbulo da minha orelha direita.
Não vais mesmo aparecer!
E, eu não vou conseguir adormecer.
Embora saiba que é inútil procurar-te no vazio da cama, no frio do quarto, no silêncio da casa, na escuridão do jardim, na moldura da foto a preto e branco, na tal canção francesa.
Afinal, na minha memória és já uma névoa...