26 de fevereiro de 2014

O DESEJADO


Já caiu a noite sobre os campos de Shuaquen.
Há o vento do deserto e frio a cheirar a morte.
Milhares de corpos amontoados.
Os feridos, os mortos, os moribundos;
os mutilados sem glória nem esperança.

Vultos sonâmbulos, por entre pequenas fogueiras,
vão curvados na desgraça, agradecendo a sorte.
Nas sombras, vivos e esgotados.
Há gritos de agonia e outros furibundos
e arrepios, para apagar da lembrança.

Ao longe, entre duas dunas, no meio de palmeiras,
numa enorme tenda jaz no seu leito de morte
o jovem do elmo e da armadura dourados,
de sonhos loucos e dois golpes fundos.  
Da brava gente, poucos sobram da matança.

Desaparecido para sempre, no auge da contenda,
‘O Desejado’  lhe chamaram e nasceu uma lenda.



(Lisboa, 4 de Agosto de 1978 – 4º centenário da Batalha de Alcácer Quibir )