6 de novembro de 2019

AINDA ANTES DO JANTAR

O homem veio devagar, detrás da coluna onde se encosta a máquina multibanco da praça da alimentação. Permaneceu de pé, numa indecisão pelo lugar. Havia muito poucas mesas por ocupar.
Reparei nos braços pendentes, ao longo do casaco já gasto pelo uso, a camisa de padrão incerto e as calças de um azul encardido deixavam de fora uns sapatos castanhos de onde tinham desaparecido os atacadores.
O olhar triste e vago, a face mais marcada pela barba de trato descuidado realçavam o seu ar cinzento.
Havia três mesas alinhadas, uma delas tinha tabuleiros com restos abandonados à espera da senhora do carrinho que os viesse recolher. A senhora gorda e o rapazinho de óculos de aros grossos que a tinham ocupado ainda iam ao fundo perto da escada rolante.
O homem sentou-se na mesa do meio. A dos tabuleiros como se fossem o seu jantar. Adivinhei-lhe a intenção embora sem querer acreditar na inevitabilidade do que ia acontecer..
Entretanto a atenção foi-me desviada pois a fila onde estava à espera de poder servir-me, avançou tinha chegado a minha vez.
Uns três minutos depois, já de tabuleiro na mão, num gesto instintivo, virei-me e olhei para o local das três mesas junto à coluna. Afinal, havia duas mesas vazias.
Ele já lá não estava e os pratos estavam vazios. A senhora do carrinho da recolha de restos chegava. Quando comecei a andar de tabuleiro nas mãos, vi-o passar por mim. Mantinha o olhar baixo talvez menos cinzento do que quando o vi chegar.
Mas imensamente triste...