24 de março de 2021

SOMOS MUITO, ASSIM

 

Somos muito, assim.
Nunca sabemos o verdadeiro valor de algo que acontece, que vivemos num dado momento, até que se transforme numa memória, longínqua.
Um dia, ao revivê-lo manchado pela saudade, percebemos que ele foi tão sublime e afinal passou-se como se não estivéssemos estado.
Somos muito, assim.
A nossa memória sendo tão imperfeita não nos permite recordar aquilo que não fizemos, não vivemos, como dizia Pessoa, é justamente do que não fizemos, não vivemos de que temos mais saudades.
Somos muito, assim.
Seres paradoxais servidos por memórias selectivas, punitivas, raramente purificadoras. Somos, então, maioritariamente apaixonados pelo futuro, perdulários do presente, saudosos do passado.
Nesta atrapalhação que nos faz pensar hoje aquilo que fizemos ontem e que tencionamos fazer amanhã, vivemos um presente matizado por memórias, acontecimentos e projectos. Um presente demasiado para que possamos olhá-lo com a atenção que merece.
Somos muito, assim.